A Bíblia é um livro que parece complicado. Sua formação foi muito lenta e muito complexa. A maior parte de seus livros são obra de muitas mãos e a composição de alguns deles durou séculos. Por isso, não é fácil lê-la e a tentação do fundamentalismo é grande. Mas, é ele que destrói o verdadeiro sentido das Escrituras, exatamente quando o conteúdo parece ser mais fiel à Palavra de Deus! Contudo, se tivermos algumas chaves de leitura, será mais fácil compreendê-la. Vejamos.
As Escrituras Sagradas são um conjunto de livros, escritos em épocas, estilos e situações diferentes. Por exemplo:
Épocas diferentes: as partes mais antigas dos Textos Sagrados podem vir do século XII a.C., lá pelo ano 1100; enquanto o último livro do Novo Testamento, a Segunda Carta de Pedro, é do final do século I ou início do século II d.C.
Estilos diversos: o livro de Josué conta a entrada do povo de Israel de modo triunfal e heróico; os 11 primeiros capítulos do Gênesis são uma meditação em forma de parábolas; o livro de Jó é uma historinha como a nossa literatura de cordel. Os Salmos são poemas; Isaías e Jeremias são coleções de oráculos; há cartas, narrações populares como a do profeta Eliseu (cf. 2Rs 2, 19-25; 6,1-7), além de histórias para despertar a piedade, como as de Ester, Judite, Jonas e Tobias.
Situações diferentes: algumas partes foram escritas em momentos de glória, como alguns provérbios mais antigos; outras, em momento de perseguições e sofrimentos, como o Livro de Daniel.
Mais ainda: os livros das Escrituras têm preocupações diferentes, objetivos diversos:
Os 11 primeiros capítulos do Gênesis querem refletir sobre por que Deus criou tudo, qual o papel do homem e por que o mundo é marcado pelo mal e pela morte. O livro de Jó quer matar uma charada: por que o homem de bem sofre? Os livros dos macabeus querem consolar e animar o povo nas tribulações. As cartas de São Paulo querem catequizar as comunidades e resolver os problemas que nelas surgiam. Os evangelhos querem anunciar que Jesus é o Messias Morto e Ressuscitado.
Os autores humanos das Escrituras são muitíssimos: alguns livros foram escritos por um autor sozinho; outros, por muitos autores; outros ainda por autores desconhecidos. Nem sempre o nome do autor que aparece é verdadeiro. Por exemplo:
Os cinco livros do Pentateuco foram escritos por vários autores e costuram quatro livrinhos diferentes que contam, cada um do seu jeito, as mesmas histórias. O livro de Tobias é de um autor só, mas não sabemos quem é ele. O livro dos Salmos tem muitos autores; já o livro do Eclesiástico é de um tal Jesus ben Sirac. A carta aos Hebreus não é de São Paulo nem a Segunda de Pedro é de São Pedro.
Os autores, quando escreviam, não sabiam que estavam escrevendo a palavra de Deus, assim, escrevem no seu linguajar, do seu jeito, com suas capacidades e limitações. Por isso, na Bíblia, é possível encontrar erros de geografia, de história, de biologia, etc...
Se formos resumir a história da formação das Escrituras, poderíamos afirmar que o primeiro modo como aconteceu a transmissão da revelação de Deus foi a tradição oral. Somente a partir do rei Davi é que as Escrituras começaram a ganhar corpo. Antes dele, além da tradição oral existiam somente alguns documentos breves, que, mais tarde, seriam aproveitados e, hoje, estão espalhados pelo Pentateuco e por alguns dos livros históricos.
No entanto, apesar de toda esta variedade, de um modo tão humano de escrever e de pensar, a Bíblia toda tem um só autor: Deus! Ela é a Palavra do Senhor, dada para nossa salvação. A Bíblia contém a verdade que salva, a verdade sobre Deus, sobre o homem e sobre o mundo. Nisto ela é infalível, não se engana nem engana!
Dom Henrique Soares da Costa / Pastoral da Comunicação da Paróquia de Sant'Ana - http://matrizdesantana.blogspot.com.br/
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