quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Quarta-feira de Cinzas: Questões essenciais que todo católico precisa saber

1. O que é a Quarta-feira de Cinzas?

É o primeiro dia da Quaresma, ou seja, dos 40 dias nos quais a Igreja chama os fiéis a se converterem e a se prepararem verdadeiramente para viver os mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo durante a Semana Santa.



A Quarta-feira de Cinzas é uma celebração que está no Missal Romano, o qual explica que no final da Missa, abençoa-se e impõe-se as cinzas obtidas da queima dos ramos usados no Domingo de Ramos do ano anterior.

2. Como nasceu a tradição de impor as cinzas?

A tradição de impor a cinza é da Igreja primitiva. Naquela época, as pessoas colocavam as cinzas na cabeça e se apresentavam ante a comunidade com um “hábito penitencial” para receber o Sacramento da Reconciliação na Quinta-feira Santa.

A Quaresma adquiriu um sentido penitencial para todos os cristãos por volta do ano 400 d.C. e, a partir do século XI, a Igreja de Roma passou a impor as cinzas no início deste tempo.

3. Por que se impõe as cinzas?

A cinza é um símbolo. Sua função está descrita em um importante documento da Igreja, mais precisamente no artigo 125 do Diretório sobre a piedade popular e a liturgia: “O começo dos quarenta dias de penitência, no Rito romano, caracteriza-se pelo austero símbolo das Cinzas, que caracteriza a Liturgia da Quarta-feira de Cinzas. Próprio dos antigos ritos nos quais os pecadores convertidos se submetiam à penitência canônica, o gesto de cobrir-se com cinza tem o sentido de reconhecer a própria fragilidade e mortalidade, que precisa ser redimida pela misericórdia de Deus. Este não era um gesto puramente exterior, a Igreja o conservou como sinal da atitude do coração penitente que cada batizado é chamado a assumir no itinerário quaresmal. Deve-se ajudar os fiéis, que vão receber as Cinzas, para que aprendam o significado interior que este gesto tem, que abre a cada pessoa a conversão e ao esforço da renovação pascal”.

4. O que simbolizam e o que recordam as cinzas?

A palavra cinza, que provém do latim “cinis”, representa o produto da combustão de algo pelo fogo. Esta adotou desde muito cedo um sentido simbólico de morte, expiração, mas também de humildade e penitência.

A cinza, como sinal de humildade, recorda ao cristão a sua origem e o seu fim: “E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra” (Gn 2,7); “até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás” (Gn 3,19).

5. Onde podemos conseguir as cinzas?

Para a cerimônia devem ser queimados os restos dos ramos abençoados no Domingo de Ramos do ano anterior. Estes recebem água benta e logo são aromatizados com incenso.

6. Como se impõe as cinzas?

Este ato acontece durante a Missa, depois da homilia e está permitido que os leigos ajudem o sacerdote. As cinzas são impostas na fronte, em forma de cruz, enquanto o ministro pronuncia as palavras Bíblicas: “Lembra-te de que és pó e ao pó voltarás” ou “Convertei-vos e crede no Evangelho”.

7. O que devem fazer quando não há sacerdote?

Quando não há sacerdote, a imposição das cinzas pode ser realizada sem Missa, de forma extraordinária. Entretanto, é recomendável que antes do ato participem da liturgia da palavra.

É importante recordar que a bênção das cinzas, como todo sacramental, somente pode ser feita por um sacerdote ou um diácono.

8. Quem pode receber as cinzas?

Qualquer pessoa pode receber este sacramental, inclusive os não católicos. Como explica o Catecismo (1670 ss.), “sacramentais não conferem a graça do Espírito Santo à maneira dos sacramentos; mas, pela oração da Igreja, preparam para receber a graça e dispõem para cooperar com ela”.

9. A imposição das cinzas é obrigatória?

A Quarta-feira de Cinzas não é dia de preceito e, portanto, não é obrigatória. Não obstante, nesse dia muitas pessoas costumam participar da Santa Missa, algo que sempre é recomendável.

10. Quanto tempo é necessário permanecer com a cinza na fronte?

Quanto tempo a pessoa quiser. Não existe um tempo determinado.

11. O jejum e a abstinência são necessários?

O jejum e a abstinência são obrigatórios durante a Quarta-feira de Cinzas, como também na Sexta-feira Santa, para as pessoas maiores de 18 e menores de 60 anos. Fora desses limites, é opcional. Nesse dia, os fiéis podem ter uma refeição “principal” uma vez durante o dia.

A abstinência de comer carne é obrigatória a partir dos 14 anos. Todas as sextas-feiras da Quaresma também são de abstinência obrigatória. As sextas-feiras do ano também são dias de abstinência. O gesto, dependendo da determinação da Conferência Episcopal de cada país, pode ser substituído por outro tipo de mortificação ou oferecimento como a oração do terço.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Campanha da Fraternidade 2020

A Campanha da Fraternidade 2020, que tem como tema “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso”, foi buscar na Parábola do Bom Samaritano (Lc 10), o modelo de relação e encontro que deve nortear a Missão da Igreja e, consequentemente, da Província. Os três verbos que aparecem no versículo que serve de lema – Ver, sentir compaixão e cuidar – remetem ao consagrado método adotado na caminhada eclesial de modo muito frequente a partir do Pós-Concílio Vaticano II. No exemplo pedagógico que apresenta, Jesus deixa bem claro qual é o ponto de partida da proposta de discipulado que Ele vem apresentar: de que maneira o Amor a Deus e ao próximo transforma concretamente as pessoas, as relações e o mundo.


VIU 

Mais do que um ato fisiológico de percepção da luz, das imagens e das cores, olhar é uma postura que se assume diante dos apelos e estímulos que nascem da realidade. O olhar, assim como as outras habilidades humanas, também pode ser treinado, dirigido e orientado de acordo com uma série de interesses, prioridades e valores. Na parábola do Bom Samaritano, podem ser identificados três tipos de olhar:

1) O olhar dos assaltantes – Viram naquele homem que passava uma oportunidade de obter benefício imediato sem grande empenho. Bastava usar um pouco da força física e da vantagem numérica para subtrair da vítima tudo o que ela possuía e que atendesse a seus interesses. Não tinham a menor preocupação em saber quem era aquele que passava nem estavam preocupados com sua vida de maneira que o deixaram ferido, espoliado e quase morto à beira do caminho. Trata-se do olhar do egoísmo, da exploração, do ódio, totalmente alheio aos princípios da ética, da empatia e da compaixão. É um olhar que mata, fere e que rouba a dignidade das pessoas. Este tipo de olhar está no germe da corrupção, da violência, do autoritarismo, da devastação da natureza, das grandes guerras, das gritantes desigualdades sociais e demais mazelas que assolam o Brasil e o mundo.

2) O olhar do levita e do sacerdote – É o olhar da indiferença, da inversão dos valores da incompreensão do que é prioritário. É a postura de quem “dá de ombros” diante de situações urgentes, em que a vida encontra-se frontalmente ameaçada. É a postura cantada pelo Padre Zezinho na célebre canção: “Seu nome é Jesus Cristo e passa fome e grita pela boca dos famintos. E a gente quando vê passa adiante, às vezes pra chegar depressa à igreja”. Nasce do individualismo, da sede crescente pelo consumo, da cultura do descartável, opções de vida que vêm sendo profundamente criticadas pelo Papa Francisco em seus discursos, entrevistas e nos documentos papais.

3) O olhar do samaritano – É o olhar solidário, do serviço e do comprometimento. Na cena em que os assaltantes enxergaram uma oportunidade de lucro fácil, o levita e o sacerdote viram um possível “estorvo” a seus programas preestabelecidos, o samaritano viu um irmão que necessitava de um cuidado urgente e imediato. Assim como os personagens anteriores, o samaritano não esteve interessado, num primeiro momento, em saber quem era aquele que jazia quase morto. Não era importante naquele momento. O prioritário era socorrê-lo e garantir-lhe a sobrevivência. Ali encontrou uma oportunidade única e inédita de amar. É o olhar da disponibilidade, da doação gratuita e da identificação com o outro, especialmente com suas lutas e dores. É o modo de olhar adotado por Jesus (cf. p.ex. Mt 9,36) e que Ele convida seus discípulos a também assumir.

SENTIU COMPAIXÃO

Ao descrever a piedade que Francisco trazia no coração, São Boaventura escreveu na Legenda Maior:

A verdadeira piedade, que, na palavra do Apóstolo, é útil a todas as coisas, enchera o coração de Francisco, compenetrando-o tão intimamente, que parecia dominar totalmente a personalidade do homem de Deus. Nasciam daí a devoção que o elevava até Deus, a compaixão que fazia dele um outro Cristo, a amabilidade que o inclinava para o próximo, e uma amizade com cada uma das criaturas, que lembra nosso estado de inocência primitiva.

Sentir compaixão é aproximar-se de Cristo e, num mesmo movimento, inclinar-se para o próximo e construir uma relação de reverência e fraternidade com os bens da criação.

1) Compaixão e justiça – Na prática de Jesus, o senso de justiça ultrapassa o limite da retribuição baseado na máxima de premiar quem acerta e punir quem erra. Nesta direção aponta o trecho do Sermão da Montanha no qual o Filho descreve o modo de proceder do Pai: “Amai vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, orai pelos que vos maltratam e perseguem. Deste modo sereis os filhos de vosso Pai do céu, pois ele faz nascer o sol tanto sobre os maus como sobre os bons, e faz chover sobre os justos e sobre os injustos.” Não se trata de assumir o caminho do comodismo, da ingenuidade nem da omissão, mas adotar uma postura restaurativa em relação à vida em suas diversas manifestações. Restauração, restituição, reconstrução e conversão são práticas intimamente relacionadas ao tempo Quaresmal e à Espiritualidade Franciscana, atitudes que exigem empenho individual e comunitário, além de organização, corresponsabilidade e empenho.

2) Compaixão e misericórdia – Misericórdia é o movimento do coração que se dispõe ao encontro. É iniciativa que parte de Deus e se manifesta em Jesus Cristo, quando a Onipotência Divina toca a fragilidade humana a partir de dentro da História e do interior de cada coração humano chamado a tornar-se manso e humilde tal qual o Coração de Jesus. Explica o Papa Francisco, na Bula Misericordiae Vultus:

A missão, que Jesus recebeu do Pai, foi a de revelar o mistério do amor divino na sua plenitude. « Deus é amor » (1 Jo 4, 8.16): afirma-o, pela primeira e única vez em toda a Escritura, o evangelista João. Agora este amor tornou-se visível e palpável em toda a vida de Jesus. A sua pessoa não é senão amor, um amor que se dá gratuitamente. O seu relacionamento com as pessoas, que se abeiram d’Ele, manifesta algo de único e irrepetível. Os sinais que realiza, sobretudo para com os pecadores, as pessoas pobres, marginalizadas, doentes e atribuladas, decorrem sob o signo da misericórdia. Tudo n’Ele fala de misericórdia. N’Ele, nada há que seja desprovido de compaixão.

No mesmo Documento, o Santo Padre descreve como a Misericórdia se concretiza na prática de Jesus e quais são os destinatários preferenciais dela: a multidão cansada e abatida (Mt 9,36), os doentes que se lhe apresentavam (Mt 15,37), a multidão faminta no milagre da multiplicação dos pães (Mt 15,37), o endemoniado de Gerasa (Mc 5,19), a viúva de Naim, quando sepultava seu único filho (Lc 7,15), entre tantos outros.

3) Compaixão e caridade – Baseando-se na Doutrina Social da Igreja, o Texto-Base da CF 2020 chama atenção para a dimensão social e comunitária da caridade, como elemento de transformação da sociedade. Além de ser compromisso individual do cristão, também se espera que seja uma “força capaz de suscitar novas vias de enfrentamento dos problemas do mundo de hoje renovando estruturas, organizações pessoais e ordenamentos jurídicos” (Texto-Base CF 2020, n. 117). Nesta direção, tendo em vista a prevalência do viés econômico na determinação dos rumos da sociedade, merece nota de destaque a iniciativa do Papa Francisco em convocar para este ano, na cidade de Assis, entre os dias 26 e 28 de março, o encontro “A Economia de Francisco: os jovens, um pacto, o futuro”, voltado a jovens que atuam e militam no campo econômico. O motivo que levou o Santo Padre a escolher Assis como sede deste encontro serve também de convocação à Família Franciscana e a contribuição que ela pode dar para o cultivo de novas relações econômicas baseadas no respeito e na solidariedade:

Com efeito, ali (em Assis) Francisco despojou-se de toda a mundanidade para escolher Deus como Estrela polar da sua vida, fazendo-se pobre com os pobres, irmão universal. Da sua escolha de pobreza brotou também uma visão da economia que permanece extremamente atual. Ela pode dar esperança ao nosso amanhã, não apenas em benefício dos mais pobres, mas da humanidade inteira. Aliás, ela é necessária para o destino de todo o planeta, a nossa casa comum, “a nossa irmã Terra Mãe”, como Francisco a chama no seu Cântico do Irmão Sol.

CUIDOU DELE

A dimensão do cuidado remete à prática transformadora da compaixão que é despertada por um olhar que se deixa tocar pelos apelos da realidade. No Texto-Base, podem ser encontradas 57 sugestões de ações concretas que têm no cuidado seu ponto de partida. Elas estão compreendidas entre os números 214 e 216 do documento. Tais sugestões são convergentes em relação a diversas ações propostas no Plano de Evangelização da Província (2016-2021), especialmente quando vêm expressas as prioridades do sexênio, entre elas a de “Reforçar ações em direção a uma ‘Província em saída’ e articulada em suas cinco frentes de evangelização”. Também estão em consonância com os quatro pilares da comunidade descritos nas DGAE: Palavra (Iniciação Cristã e animação bíblica da vida e da pastoral), Pão (liturgia e espiritualidade), Caridade (serviço da vida) e Ação Missionária (estado permanente de missão). Ao tratar de cada um deles, o documento traz uma série de sugestões de encaminhamentos práticos que dão concretude à dimensão do cuidado.

CONCLUINDO

Não faltam documentos e reflexões para nortear o percurso pessoal e comunitário que a Igreja do Brasil sugere para a Quaresma deste ano de 2020. O próprio Magistério do Papa Francisco é pródigo em oferecer caminhos de ousadia, coragem e desprendimento a todos aqueles que desejam se aprofundar na radicalidade cuidadosa proposta no Evangelho. Mais do que oferecer novidades, esta breve reflexão teve como objetivo principal aguçar o entusiasmo dos confrades e dos demais leitores para viverem de forma comprometida e encarnada as provocações que Jesus apresenta ao contar a Parábola do Bom Samaritano.

domingo, 23 de fevereiro de 2020

Evangelho do 7º Domingo do Tempo Comum

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: “Vós ouvistes o que foi dito: ‘Olho por olho e dente por dente!’. Eu, porém, vos digo: Não enfrenteis quem é malvado! Pelo contrário, se alguém te dá um tapa na face direita, oferece-lhe também a esquerda! Se alguém quiser abrir um processo para tomar a tua túnica, dá-lhe também o manto! Se alguém te forçar a andar um quilômetro, caminha dois com ele! Dá a quem te pedir e não vires as costas a quem te pede emprestado. Vós ouvistes o que foi dito: ‘Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo!’. Eu, porém, vos digo: Amai os vossos inimigos e rezai por aqueles que vos perseguem! Assim, vos tornareis filhos do vosso Pai que está nos céus, porque ele faz nascer o sol sobre maus e bons, e faz cair a chuva sobre justos e injustos. Porque, se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os cobradores de impostos não fazem a mesma coisa? E se saudais somente os vossos irmãos, o que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa? Portanto, sede perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito!”. (Mt 5,38-48)


Ninguém se torna santo se não amar

Essa é a vocação de todos nós, a vocação para a santidade. Nós não podemos querer almejar outra coisa a não ser sermos santos. Não é luxo ser santo, é obrigação, é responsabilidade, é corresponder à graça do batismo que todos nós recebemos. Não é uma santidade em que nos tornamos pessoas piegas ou falsamente piedosas. Não! É a santidade da vida, é santidade dos frutos, é santidade que nos leva até a mudar a nossa concepção da vida. A primeira exigência da santidade é o amor, pois ninguém se torna santo se não amar. Mas não é amar quem nós gostamos, quem é próximo a nós, por quem nós temos afeição. Isso aí, todos vivem, todos fazem, não precisa ser cristãos nem seguidor de Jesus. O amor cristão, o amor dos seguidores de Jesus é exigente, é o amor que produz santidade, é amar quem não nos ama, é amar quem não nos quer bem, é amar os nossos inimigos, aqueles que se colocam ou criam inimizades ou se separam de nós. Rezar por quem nos persegue, rezar por quem fala mal de nós, por quem não quer bem a nós. Nós não respondemos a quem nos faz mal com o mal, nós damos como resposta a nossa oração verdadeira, sincera, concreta e real. É dessa forma que nós nos tornamos, verdadeiramente, filhos do nosso Pai do Céu. Segundo ponto, nós não respondemos com a vingança. Aquele que é seguidor de Jesus não cultiva a vingança no seu coração, mas responde com a bondade e a misericórdia de Deus. A sua outra face não é a face da vingança pela vingança; a sua outra face é a face do amor e da misericórdia. É assim que nós respondemos àqueles que nos fazem mal, porque se nós assim não o fizermos, como é que seremos, de fato, filhos do nosso Pai que está nos céus? Nosso Pai não faz a bondade d’Ele só para os selecionados; Ele dá o sol para quem O ama e para quem não O ama. Ele faz chover sobre todos. É óbvio que se você procura viver a proximidade com Deus, experimenta, mais profundamente, a misericórdia d’Ele. Deus não é bom para alguns e ruim para outros. Deus é bom para com todos, mas nem todos se aproximam da bondade d’Ele do mesmo jeito. Nós não podemos ser bons de forma seletiva, pois a bondade é para com todos. Agora, há aqueles que experimentam mais o nosso amor, a nossa bondade e a nossa amizade. Para sermos santos, precisamos viver a dimensão mais profunda da vida: a santidade. O modo de não nos contaminarmos, tornarmo-nos impuros é não cultivarmos em nós a vingança, o ódio, o rancor e o ressentimento, mas sim o perdão e a misericórdia, sempre caminhando a nossa frente em tudo aquilo que fizermos e realizarmos.

sábado, 22 de fevereiro de 2020

A alegria do Carnaval

Nem sempre essa festa foi sinônimo de desregramento, pois a palavra Carnaval vem de currus navalis, o que significa que entre os gregos e romanos era feito um desfile em torno de um enorme carro em forma de navio, o qual era dedicado ao deus Dionísio ou Baco. Depois dos gregos, entre os romanos e os antigos celtas e germanos, havia solenidades pela entrada do ano civil.


Quando surgiu o Cristianismo, este deparou-se com tais comemorações, as quais, inclusive, tinham um caráter penitencial, ou seja, os pagãos queriam expiar faltas cometidas no ano anterior. “A Igreja procurou dar uma nova mentalidade a tais festas, expurgando toda mitologia e superstição, bem como a orgia, que, muitas vezes, predominava”, diz o Cônego José Geraldo (cf. cleofas.com/carnaval).

A Igreja, então, colocou o Carnaval em seu calendário, antes da Quaresma, para que, anterior ao tempo de penitência em que fazemos memória ao Cristo, o qual peregrinou pelo deserto e privou-se das necessidades de Seu corpo, os cristãos tenham um período de gozo e festa pelos dons da alegria e dos prazeres lícitos dados por Deus.

Percebemos assim, que o grande problema das festas de Carnaval de hoje não está no anseio das pessoas pela alegria, mas nos excessos e na permissividade que praticam.

A capacidade de sentir sabores, ter sensações, o riso, a dança, a celebração, a sociabilidade… Tudo isso é lícito perante a lei do Senhor e agrada muito a Ele ver Seus filhos podendo desfrutar a felicidade nessas formas. Encontramos, na Sagrada Escritura, o incentivo do Altíssimo para todos essas atividades.

Desvirtuação dos valores e da moral

Contudo, o que acontece nos eventos de Carnaval é quase sempre a desvirtuação dos valores e da moral, sem contar as ofensas a Deus.

Neste Carnaval, antes de decidir para onde vai ou o que vai fazer, devemos nos questionar: “O ambiente que pretendo ir promove, de alguma forma, a promiscuidade, o adultério e a dissolução da moral?”, “As demais pessoas que lá estarão, incluem Jesus Cristo em suas atividades?”, “Serei tentado a desrespeitar os mandamentos do Senhor?”.

Graças a Deus, existe a opção de vários retiros espirituais pelo nosso país, nos quais encontramos, além de intimidade com Deus em orações, pregações, adorações, muita música de qualidade, bailes, diversão, amigos e, quem sabe, boa comida, cores e luzes.

A personificação da felicidade

O cristão não é um alienado no mundo, não vive recolhido em penitência como é a imagem que muitos têm de nós. Pelo contrário, somos pessoas que se encontram com a felicidade em Pessoa, pois Cristo é a personificação da felicidade!

O Carnaval é o tempo que a Igreja nos deu para celebrarmos o dom da alegria de forma virtuosa, encontrando toda a graça de sermos seres humanos por meio das coisas boas que trazem sabor à vida.

É bom celebrarmos agora, para melhor adentrarmos na Quaresma depois.

“Para tudo há um tempo, para cada coisa há um momento debaixo dos céus. Tempo para chorar e tempo para rir; tempo para gemer e tempo para dançar” (Ecl 3,1-4). Deus abençoe seu Carnaval!

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Você conhece os estragos causados pelo uso de drogas?

Existem três aspectos a considerar quando falamos do consumo de drogas. Em primeiro lugar, temos as pessoas; depois, temos a droga e, finalmente, temos o ambiente. A interação entre os três fatores é que chamamos de problema das drogas.


Como cristãos, naturalmente, devemos dar prioridade sempre à pessoa. O ser humano é a parte mais importante do sistema e deve ser tratado com prioridade. A Igreja é especialista em humanidade.

As pessoas

Deus nos criou seres únicos, especiais e irrepetíveis. Dentre os mais de seis bilhões de habitantes do planeta Terra, não existem, nunca existiram e nem existirão dois iguais.

Nós recebemos dons especiais que nos tornam diferentes dos demais animais. São dons que nos identificam como seres humanos. Entre estes dons temos: a autoconsciência (poder atuar como observador de seu próprio caminho); a imaginação (capacidade de criar na mente imagens que transcendem a realidade); a moral (consciência profunda do que é certo ou errado; a livre escolha (capacidade de agir conforme nossa autoconsciência, livre de qualquer influência).

Mas há muito mais! Se tudo isso não bastasse, nós acreditamos que Deus nos deu talentos e nos assiste com a Sua graça para que saibamos usar desses dons especiais que nos tornam humanos. A nós, só é preciso vontade e disciplina para que nossa vida esteja sempre no rumo certo.

E como esquecer que Deus, através de seu filho, nos revelou o caminho, a verdade e a vida (João 14, 6), e que veio para que todas as pessoas tivessem vida em abundância? (João 10,10)

Tenhamos consciência dessas maravilhas que Deus nos fez, porque é exatamente sobre elas que agem as drogas, inclusive o álcool e o cigarro.

O usuário de drogas torna-se um dependente, isto é, precisa de uma bengala, de um arrimo para se manter. Em outras palavras, torna-se um imbecil.

O usuário de drogas perde a autoconsciência, a imaginação, a moral, a liberdade de escolha e o humor, ou seja, perde a sua racionalidade. Torna-se um animal.

As drogas

Quando falamos de drogas, estamos falando de substâncias ou produtos de origem natural ou de laboratório que produzem alterações da percepção, do humor e das sensações, ainda que temporariamente. São sensações de prazer, de euforia ou alívio do medo, da dor, das frustrações, das angústias. Algum tempo após o uso, causam sintomas muito desagradáveis. Com a constância do uso, causam dependência. Fica cada vez mais difícil ficar sem usar. O usuário torna-se um escravo da droga.

As drogas incluem: álcool, tabaco, inalantes, vários medicamentos (calmantes, estimulantes, moderadores de apetite) e tóxicos (maconha, cocaína, crack, heroína, ecstazy, lsd).

No Brasil, as drogas mais usadas são: o álcool, o cigarro, os inalantes, a maconha, os medicamentos, a cocaína e seus derivados: crack e merla.

O álcool é ainda a droga responsável por cerca de 75% dos acidentes de trânsito, 90% das internações hospitalares por dependência química e, apesar disso, continua tendo seu consumo aceito socialmente, apesar de existir leis que proíbem seu consumo por menores de idade e por condutores de veículos.

A grande maioria dos casos de violência doméstica e das mortes violentas são consequências do uso do álcool.

O uso do cigarro começa a ser restringido pelo governo e, aos poucos, pela sociedade. Já existem ambientes em que não se pode fumar, a publicidade do cigarro é limitada e o consumo começa a ser reduzido em termos nacionais. Entretanto, diversos ambientes ainda relutam em assumir campanhas contra o fumo.

Os solventes ou inalantes são usados mais intensamente pelos menores em condição de risco social, vivendo nas ruas, longe das famílias e são considerados as portas para as drogas ilícitas.

A maconha, cannabis sativa, vem sofrendo intensa campanha tentando convencer de sua reduzida toxidade e inclusive da liberação de seu consumo, comércio e produção. Em consequência disso, muitos adolescentes, jovens ou pessoas menos esclarecidas vêm experimentando seu consumo com a convicção de que não existe nada de mal. Isso tem causado grandes problemas sociais e de saúde pública.

Os medicamentos tranquilizantes, sedativos ou moderadores de apetite, são largamente utilizados especialmente pelos idosos, pelas mulheres, pelos caminhoneiros, em geral sem receita médica.

A cocaína e seus derivados, crack e merla, são as drogas cuja utilização é proibida e cujos estragos, em termos sociais e de saúde, são mais visíveis e desastrosos. Alguns casos registrados apresentam dependência após apenas algumas semanas de uso.

O ambiente

No mundo das drogas existe o produtor, o agente financeiro, o intermediário e o usuário. Em geral, nos detemos no usuário, às vezes no intermediário. O sistema de drogas é interligado com o do crime organizado, do tráfico de armas e da prostituição.

O sistema das drogas causa muito mais vítimas do que parece à primeira vista: assaltos, homicídios, violência, acidentes, doenças, prostituição, desemprego, desestruturação familiar.

Também somos responsáveis pelo problema das drogas. Não podemos fechar os olhos para o problema. O primeiro passo é a tomada de consciência. Depois podemos tomar atitudes pessoais e coletivas.

Existem as leis, mas elas são ignoradas não só pela justiça, pela polícia e pelo Governo, mas, principalmente, pelas famílias e pela sociedade como um todo. Basta ver o que acontece com o álcool, apesar de proibida a entrega, a venda e o consumo para menores de idade, nem em nossas casas nós fazemos tal restrição.

É preciso iniciar uma conscientização, como aconteceu com o fumo, para que se restrinja o consumo de álcool e assim se recupere a esperança de futuro para toda uma geração de adolescentes, nossos filhos, nosso futuro.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Evangelho do 6º Domingo do Tempo Comum

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: “Eu vos digo: Se a vossa justiça não for maior que a justiça dos mestres da Lei e dos fariseus, vós não entrareis no Reino dos Céus. Vós ouvistes o que foi dito aos antigos: ‘Não matarás! Quem matar será condenado pelo tribunal’. Eu, porém, vos digo: todo aquele que se encoleriza com seu irmão será réu em juízo. Ouvistes o que foi dito: ‘Não cometerás adultério’. Eu, porém, vos digo: Todo aquele que olhar para uma mulher, com o desejo de possuí-la, já cometeu adultério com ela no seu coração. Vós ouvistes também o que foi dito aos antigos: ‘Não jurarás falso’, mas `cumprirás os teus juramentos feitos ao Senhor’. Eu, porém, vos digo: Não jureis de modo algum. Seja o vosso ‘sim’: ‘Sim’, e o vosso ‘não’: ‘Não’. Tudo o que for além disso vem do Maligno”. (Forma breve: Mt 5,20-22a.27-28.33-34a.37 – Forma longa: Mt 5,17-37)


A nossa justiça tem de ser a justiça de Deus

Não basta acharmos que somos justos porque todo mundo se acha justo segundo a sua própria justiça. A nossa justiça não pode ser como a do mestre da lei, dos fariseus, dos hipócritas. A nossa justiça tem de ser a justiça de Deus.

Jesus nos ensina, hoje, três coisas importantes: não adianta dizer “Eu não mato, nunca matei ninguém”; meu irmão, se você se encoleriza com o seu irmão, você já é digno do réu ou do tribunal de Deus, de ser réu no tribunal divino. Você sabe que a cólera toma conta de nós, que somos movidos pela raiva, pelo ressentimento, pelo rancor. Facilmente nos irritamos, e o coração irritado (que parte para a ira) se torna um coração destemperado e diz intempéries das mais tempestivas possíveis, saem palavras pesadas, agressivas, duras. Então, se queremos viver a justiça controlemos, em primeiro lugar, a nossa cólera.

A lei divina diz: “Não cometerás adultério”. “Graças a Deus nunca adulterei”: o outro pode estar se vangloriando disso. Meu irmão, se você já olha para o outro, se você já olha para a outra desejando-a, o adultério já entrou no seu coração. Por isso, é preciso purificar a intenção interior, purificar e vigiar o nosso próprio olhar porque estamos olhando para aquilo que é pecaminoso e que traz a impureza para dentro de nós. Então, não pode vangloriar-se de ter cometido ou não o adultério, o que precisamos é purificar o nosso olhar porque o olhar puro é o que nos mantém na pureza e na integridade de vida.

Depois, nós não precisamos jurar, nós não precisamos, de forma alguma, colocar peso na nossa palavra. O que nós precisamos é de autenticidade, é viver a verdade e parar de mentir. “Ah, são apenas pequenas mentirinhas”; “ah, foi apenas para enganar”: não existe pequena “mentirinha”, o que existe é mentira, pois, ou você é uma pessoa verdadeira, uma pessoa autêntica em todas as situações ou é autêntico segundo o seu critério de autenticidade somente quando lhe convém e as coisas lhe são favoráveis. Autêntico é autêntico, verdadeiro é verdadeiro. Aquele que comunga de qualquer mentira não é digno a ser um discípulo de Jesus. “Que o vosso sim seja sim, que o vosso não seja não”, e o que passar disso é do maligno e diabólico.

Porque há pessoas que, na sua frente, diz “sim”, nas costas diz “não”; há aquele que, quando está com você quer te agradar e falar um monte de coisas, mas quando está na sua ausência diz outras coisas. Isto é a hipocrisia do mundo: a nossa falta de autenticidade; é a justiça que nós queremos exigir dos outros, mas não somos justos nem nas nossas conversas; conversas dúbias, palavras dúbias. Um homem e uma mulher sem palavra é um homem e uma mulher sem autenticidade. E ser sem palavra é: ora dizer uma coisa aqui e outra acolá.

Que a nossa palavra aqui seja essa e, na ausência da pessoa, seja a mesma palavra, isto é, ser autêntico, pois, o que passa disso é do maligno e diabólico.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Beber para quê?

Por trás de um copo com álcool há uma pessoa, uma história e, com certeza, um impulso que mobiliza o ato de levar esse copo até a boca e se deixar devanear por tal bebida. Mas que impulso é esse? Que necessidade é essa?


Freud escreve em ‘O Mal-estar na Civilização’: “Devemos a tais veículos não só a produção imediata de prazer, mas também um grau altamente desejado de independência do mundo externo, pois se sabe que, com o auxílio desse ‘amortecedor de preocupações’, é possível, em qualquer ocasião, afastar-se da pressão da realidade e encontrar um refúgio num mundo próprio, com melhores condições de sensibilidade. Sabe-se igualmente que é exatamente essa propriedade dos intoxicantes que determina o seu perigo e a sua capacidade de causar danos”.

Partindo disso, podemos encontrar alguns “para quês”, ou seja, alguns “motivos” para beber!

O álcool como fonte de prazer

Muitas pessoas têm no álcool uma fonte de prazer. É aí que eu me questiono: será que fui feito para o prazer de um gole ou para o efeito de uma dose? Se Deus me promete o prazer de uma eternidade, por que me contentar com efêmeros prazeres? Não! Minha alegria não pode estar contida em uma dose. Preciso ir além e não determinar a fonte de minha alegria em coisas que passam.

Outras pessoas bebem “para quê” possam ter independência do mundo externo, mas não dá para, nesta vida, querermos tal estado de apatia! Somos gente em relação, o mundo externo é onde nosso mundo interno se situa. Não adianta querer fugir. É preciso reagir, lutar, para que a força do nosso mundo interno mude o que está externo.

Para esquecer os problemas

Ainda há pessoas que, para amortecerem suas preocupações, encontram no álcool uma solução. Mas fica a mesma reflexão acima: por que amortecer aquilo que precisa ser enfrentado? Atos de coragem precisam ser tomados em doses de verdade e luta!
Há ainda pessoas que, para se afastarem da pressão da realidade e refugiar-se em um mundo paralelo, bebem todas doses possíveis! Porém, junto à ressaca do dia posterior surge a pressão do dia anterior e um mundo mais cruel ainda! Sobriedade para encarar pressão pode ser a saída mais certa nesses momentos.

Além dos “para quês” acima, fica ainda uma última reflexão: sabe-se que é exatamente essa propriedade dos intoxicantes que determina o seu perigo e a sua capacidade de causar danos. De fato, muitas doenças são ocasionadas pelo alcoolismo (ele já é uma doença em si).

Meu pai é vítima dessa realidade, pois até hoje sofre com fortes dores devido à pancreatite ocasionada pelo consumo excessivo de álcool. Além de males físicos, o exagero de álcool causa, em muitas famílias, situações traumáticas, abandono e negligência. Beber “para quê”?

Encerro essa reflexão querendo que você descubra o seu “para quê” beber. Mais que levantar uma bandeira de certo e errado, de pode e não pode, faz mal e faz bem (pois há no pensamento “moderno” uma necessidade de categorização absurda), quero levá-lo a uma reflexão profunda, pois por trás de um copo de álcool há uma história, uma vida! Mas que vida está sendo vivida?

domingo, 9 de fevereiro de 2020

5º Domingo do Tempo Comum

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: “Vós sois o sal da terra. Ora, se o sal se tornar insosso, com que salgaremos? Ele não servirá para mais nada, senão para ser jogado fora e ser pisado pelos homens. Vós sois a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um monte. Ninguém acende uma lâmpada e a coloca debaixo de uma vasilha, mas sim, num candeeiro, onde brilha para todos, que estão na casa. Assim também brilhe a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e louvem o vosso Pai que está nos céus”. (Mt 5,13-16)


Precisamos ser luz na vida dos outros

A primeira afirmação do Evangelho de hoje é que nós somos o sal da terra, ou seja, não é que devemos ser sal nós o somos. Isso é uma maravilha! Porque Deus nos criou com sabor, Ele não nos criou insossos, sem gosto, sem tempero. A nossa constituição vital de pessoas humanas, de seres humanos é para sermos saborosos, é para darmos sabor ao mundo, às coisas.

Nos encantamos quando vemos os animais: os golfinhos, os passarinhos; nós olhamos as baleias, os peixes, os pássaros e cada um dá um tom ao mundo em que estamos. Mas só quem dá sabor a este mundo somos nós, eu e você, nós filhos e filhas de Deus, porque nós somos criados para ser sal, para dar consistência e sabor ao mundo. Sabor de saborear, de dar realmente o tempero, mas, ao mesmo tempo, também de dar aquela consistência, porque o sal quando salga o alimento, ele o conserva, ele o mantém. Só nós podemos manter a obra criada. Conservar a obra criada e transformar o mundo em que estamos pelo tempero do sal de Deus que está em nós.

Nós somos a luz do mundo! Deus nos criou para sermos luz na vida do outro e onde estivermos. Eu sei que tem muita luz apagada, e que tristeza! Nós deixamos, muitas vezes, que a luz de Deus que está em nós se apague, então, nos tornamos canal de desânimo, de tristeza, de negativismo, de pessimismo, de maldade nas situações em que nos encontramos. Meus irmãos, ainda que haja muitas situações para desanimar, para desesperar, isto não é a resposta que nós damos, a resposta que nós damos para o mundo que jaz nas trevas, na escuridão, é a luz de Deus que está em nós.

Não deixe essa luz apagada, acenda essa luz, acenda esse ânimo, essa fé, essa coragem, esse entusiasmo; e brilhe! Por favor, não é o brilho do mundo, não é a fantasia do mundo, não é o brilho da pessoa que passa maquiagem no rosto e quer brilhar pelas aparências externas. Brilhe pela fé, pelo ânimo, pela coragem, brilhe!

Seja luz! Porque você leva a luz de Deus para os outros. Não seja uma luz apagada, ainda que passemos por muitas tribulações e aflições nesta vida, a luz de Deus está em nós e precisamos ser luz na vida dos outros.

sábado, 1 de fevereiro de 2020

Otília Oliveira (Tila): Uma vida dedicada à Tradicional Festa de São Sebastião

Notas de impressão de Otília Oliveira (Tila), principal responsável pela origem da Tradicional Festa de São Sebastião, em Bom Jardim:

No decorrer do ano de 1925, nos subúrbios desta cidade, vinha assolando uma medonha peste bubônica.


Por intercessão do mártir São Sebastião, esta cidade ficou preservada deste terrível flagelo. Em 1926, em ação de graças realizou-se uma importante romaria, encerrando-se na Rua da Palha. Não se realizou a festa de acordo com o programa por terem denunciado ao Sr. Bispo, que a nossa rua era de gente de má vida. Sua Excelência, julgando ser pessoa de consciência, na véspera da festa, mandou suspender a licença já obtida da Missa campal, em nossa rua. O programa contava de: tríduo na igreja matriz, quermesse e música na Rua da Palha. Eu e toda minha família fazíamos parte da comissão.

No ano seguinte, 1927, assumimos a Festa de São Sebastião, que se realizou no dia 02 de fevereiro, contando de um novenário em nossa rua e a Missa na igreja matriz. Com grande brilhantismo, efetuou-se a festa predileta do mártir São Sebastião, com o desejo de realizar-se todos os anos.

No terceiro ano, realizou-se a festa novamente, constando somente do novenário em nossa rua. O motivo foi este: O Reverendíssimo Padre Fernando, vinha angariando o óbolo pelas Paróquias, para a construção da catedral. Reconhecido aqui, nesta cidade, como bom pregador. A comissão, em silêncio, resolveu aguardar a visita do reverendíssimo padre, desejando que ele fosse o celebrador da Festa de São Sebastião, mas sim de acordo com o senhor vigário. Foi esta a nossa intenção e o nosso desejo. Afinal, chegou o Padre Fernando, por acaso, na segunda girândola inicial da festa. Pessoas que conviviam com o senhor vigário, já tinham assinado, em silêncio, uma improvisada trama e lançá-la contra a festa do mártir São Sebastião, a fim de nos prejudicar.

E os reverendíssimos padres, sem nenhum reparo, aprovaram a trama e, raivosos, quiseram acabar com a festa, mas não foi possível. No dia 03 de fevereiro, pela manhã, ao romper da aurora, como no ano anterior, fez-se o encerramento da festa, alegremente. Após, fui à Missa do Apostolado da Oração, fadigada de sono, pois era obrigada – visto ser zeladora e secretária. Ao terminar a Missa, o senhor vigário falou seriamente, protestando contra a festa. Eu, reconhecida como dirigente da festa, ao ouvir tal protesto rigoroso, desmaiei horrorizada.

Quarto ano. Festa de São Sebastião! Santo glorioso da predileção do povo católico. Em 1929, o povo em geral desejava saber ansioso se havia a Festa de São Sebastião. E eu, em silêncio, fazendo preces à Imaculada Conceição, pedindo que mudasse de sentido, caso a festa prejudicasse a religião católica. Supliquei com muita piedade. Nas minhas súplicas, não tive nenhuma impressão má contra a festa. Pois, sob a proteção de Nossa Senhora, dei começo a novo trabalho da festa e continuei com as minhas preces à Nossa Senhora, pedindo proteção.

Com antecedência, a comissão mandou participar ao pároco. Ele disse que ainda tinha a haver com esta festa. Alegou haver uns motivos que não se aprovou. Finalmente, não houve pedido que ele aceitasse, nem o do senhor Bispo Diocesano. Mas, como Nossa Senhora tem grande poder, o senhor Bispo obedeceu à Rainha do Céu e cedeu a licença para a Missa campal em minha residência. E cedeu também o Padre Severino Mariano, para celebrar a Missa do mártir São Sebastião.

Foi um verdadeiro milagre que a Festa de São Sebastião alcançou, por intercessão de Nossa Senhora, Mãe dos aflitos. Encerrou-se a festa a 03 de fevereiro, na maior alegria e contentamento. Salve, Rainha do Céu!

Eis o meu maior suplício... Após a festa que era dia de domingo, o senhor vigário aperreou-se bastante. Não celebrou a Missa paroquial. Mandou pedir exoneração do cargo de Vigário, pelo celebrante da Missa da festa. Correu o boato pelo mundo. Espalhou-se que foi “filha de Maria” que botou o senhor vigário para fora daqui.

Uns me acusavam, outros me defendiam, outros queriam me expulsar da igreja. Agradeço este “martírio” à peste bubônica.

No dia 17 de fevereiro, o senhor vigário achava-se com o mesmo cargo. Era dia de domingo. Fui à Missa, afim de levar um quadro do Coração de Jesus para benzer, e fui convidada para ir à casa do senhor vigário, para uma manifestação. Na hora determinada, fui conduzindo o estandarte da Pia União das Filhas de Maria, que me amparava da vista do meu diretor vigário, pois via que minha presença o molestava.

Daí em diante, foi luta e sofrimento. Pessoa sem competência dava-me suspensão dos trabalhos que fazia na igreja. O Sacristão apresentava novos membros para exercerem o meu lugar. Tudo isto me causava grande mágoa. Finalmente, só não sentia impressão dos sinos, porque me soavam com os mesmos sons de outrora. Sentia-me como uma “ovelha desgarrada”, sem pastor.

Enviei, na primeira sexta-feira do mês de março, um ofício ao reverendíssimo padre, pedindo exoneração dos cargos que ocupava na igreja matriz. Soube que foi uma sessão de lágrimas. A presidenta do Apostolado, que era diretora da Pia União, prendeu o ofício e não apresentou na sessão. O diretor silenciava, fez a reunião. A presidenta veio a minha residência, pediu-me, caridosamente, para eu ficar com meus cargos. Mas pensei seguramente, uns três meses contrariados. Saí de casa somente para ouvir a Missa, com o maior sacrifício. A Missa apresentava-me fúnebre.

No mês de abril, durante a Semana Santa, fui à igreja com assiduidade, desejando fazer a minha comunhão pascal, mas não foi possível obter um convite de confissão em geral. Depois da Páscoa, não pude me conter. Chorei sentidamente. As comunhões espirituais que fazia não me saciavam a sede. No fluente mês, dia da Associação de São José, fui me confessar, e o confessor fugiu sutilmente do confessionário. Fiquei exausta de dor. Regressei à casa, após a Missa, e chorei amargamente. Pedi, então, a Nossa Senhora, que me ceifasse a vida. Que, no leito da agonia, seria fácil a minha confissão. Estava me sentindo muito resfriada das tristezas, quando gravemente adoeci. Sem querer tratamento, pois ninguém sabia de minha resolução.

A minha diretora soube do meu emperro, resignou-me e fez eu tomar os remédios que fiquei restabelecida. Eis a minha luta! No próximo sábado de maio, cheia de coragem, tentei e fui à igreja, me confessar. Lá, estava a diretora e filhas de Maria, se confessando. E eu reservei-me, esperei que todas fizessem suas confissões, e fui a última, sem ser esperada, o que causou admiração. Após a minha comunhão, toda a igreja me sorria, até o próprio vigário suavizou-se.

Quem foi que me chamou à Mesa Eucarística? Foi Jesus, na Hóstia Santa! O Divido Pastor das almas. Como me achava em opressão, pasmei! Quando Jesus Hóstia veio a meu coração, saciou-me. Muito penhorada, agradeci ao meu Bom Jesus, a sua visita. 04 de maio de 1928.

Regozijada, agradeci a Nossa Senhora da Paz, da missão que se encarregou de me acompanhar no transe da minha “paixão”; e a São Sebastião glorioso, que me conduziu, salvando-me.

22 de agosto de 1931, essas são as minhas notas de impressão.
Otília Engrácia de Oliveira.